Revista Ações Legais - page 52-53

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Nossa Constituição incorporou a linguagem de “crime de responsabilidade”. Não lhe ca-
bia descrevê-lo, o que se fez por lei ordinária. Os desatinos do governo Dilma se subsu-
mem como uma luva às expressões típicas da lei.
De início, temos a infração administrativa, a hipótese de irresponsabilidade na condução
da coisa pública. Por si só já justifica o impedimento, sem prejuízo de sanções civis e pe-
nais. “Pedaladas fiscais”, abertura de crédito sem lei autorizativa, desvio de finalidade
para nomear Ministro sem observância dos requisitos contemplados no art. 37 da CF e,
ainda, pelas mesmas e ainda mais graves razões, barganha de ministérios com grupos to-
talmente incapazes de cumprir o preceito da eficiência, formam, como disse a professora
de direito da USP Janaína Paschoal em seu brilhante pronunciamento aos parlamentares,
um conjunto de imoralidades suficiente ao afastamento de qualquer governo.
Como não temos o salutar instituto do “recall”, só resta o impedimento. A ele está sujeito
o agente público que não cumpre a Constituição ou leis infraconstitucionais. O bem jurí-
dico tutelado pela fiscalização política do parlamento é a correta administração da coisa
e das finanças públicas, que não podem ser dissipadas, deliberadamente ou por meros
erros de atuação governamental. Logo, quem não respeita o sistema normativo, quem
recorre a pedaladas ou maquiagens fiscais, quem abre créditos suplementares autorita-
riamente, sem autorização do Legislativo, quem incorre em desvio de finalidade, como a
nomeação de alguém Ministro não em vista do bem comum, mas para auxiliá-lo a esca-
par das malhas da lei, quem comercializa Ministérios para salvar-se está sujeito ao afas-
tamento do governo, como forma de preservação dos superiores interesses populares;
depois se haverá com os juízes.
Assim compreendida, substancial e não apenas semanticamente, a expressão “crime de
responsabilidade”, como pontuou, a bem da simplicidade e da pedagogia jurídica, o Se-
nador Anastasia na tribuna do Senado em 29/3, resta evidente que a Presidente incorreu
em infração administrativa, dissipadora de nossas finanças, o que, por si só, justifica o
impedimento previsto na Carta da República. À luz do bom direito, cai por terra a tres-
loucada invencionice de “golpe”, outra manipulação da linguagem, da qual se socorre o
governo para manter-se no poder a qualquer preço.
Amadeu Garrido de Paula é jurista
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