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ARTIGO
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possibilidadede responsabilizaçãodos sócios por
dívidas da sociedade empresária, desde que pre-
sentes os requisitos legais, já não é novidade no
ordenamento jurídico. No entanto, uma questão menos
discutida, mas já consolidada pelos Tribunais pátrios, é a
da responsabilização da pessoa jurídica por dívidas dos
sócios. Essa é a chamada desconsideração “inversa” da
personalidade jurídica.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no jul-
gamento do Recurso Especial n° 948.117-MS, relatado pela Ministra Nancy Andrighi e julgado
em22/06/2010, entendeu que é possível o afastamento da autonomia patrimonial da sociedade
empresária, responsabilizando-a pelo pagamento de dívidas pessoais de seus sócios. A Terceira
Turma decidiu que desconsideração inversa pode ocorrer quando se verifique o abuso de direi-
to do sócio, como intuito de fraudar credores, transferindo seus bens pessoais para a empresa
como objetivo de impedir a localização dos mesmos.
Assim, para que ocorra a desconsideração inversa, é necessária a presença do requisito do arti-
go 50 do Código Civil: o abuso de direito, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confu-
são patrimonial. Além disso, é necessária a insolvência do sócio devedor, ou seja, ele não deve
ter benspróprios capazesde saldar suasdívidaspessoais, atéporque, havendobens suficientes,
não haveria fraude aos credores.
Esse tipo de prática, embora reprovável, é comum em casos de separações e divórcios emque
o cônjuge, visando livrar parte (ou a totalidade) de seus bens da partilha, transfere-os para a
pessoa jurídica. Porém, caso essa situação seja comprovada judicialmente, será possível atingir
o patrimônio da pessoa jurídica, desmantelando a fraude praticada.
Verifica-se, portanto, a importância de agir de acordo com a boa-fé e manter uma clara separa-
ção entre o capital da sociedade e o patrimônio pessoal dos sócios, pois, uma vez caracterizado
o abuso de direito por meio do desvio de finalidade ou da confusão patrimonial, a divisão entre
a responsabilidade dos sócios e da sociedade também pode ser dissipada, tanto para atingir o
sócio em relação às dívidas da pessoa jurídica quanto para atingir a pessoa jurídica quanto às
dívidas do sócio.
Desconsideração inversa da
personalidade jurídica
Por Anna Caroline de Lima Escolaro,
advogada