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para pernoite temporário ou como moradia provisória, dados que concentram apenas uma
parcela dessa população, tendo em vista que nem todos estão inseridos no referido cadas-
tro. O Movimento Nacional da População em Situação de Rua estima que sejam mais de
5.000 pessoas nessa condição em Curitiba.
Entre os fatores que podem levar uma pessoa a viver nas ruas, destacam-se o desemprego
(ampliado significativamente a partir de 2014) e o trabalho informal. São milhares de pes-
soas vivendo, por exemplo, da coleta de materiais recicláveis, na guarda de carros ou ven-
dendo produtos em semáforos, com geração de renda insuficiente para o atendimento das
suas necessidades básicas, incluindo a moradia. Embora os dados sejam antigos, pesquisa
realizada em 2007 peloMinistério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e pelo Ins-
tituto Meta, em 71 cidades brasileiras, incluindo Curitiba, já apontava que 71% da população
em situação de rua era composta por trabalhadores com alguma atividade remunerada,
destacando-se: catadores de materiais recicláveis (28%), flanelinhas (14%) e trabalhadores
da construção civil (6%) e do setor de limpeza (4%), mas somente 2% com carteira assinada.
O estudo constatou ainda que 16% das pessoas em situação de rua pediam dinheiro como
principal meio de sobrevivência, e 25% delas não possuíam sequer documentos de identifi-
cação, dificultando a obtenção de empregos formais e o acesso a serviços e programas go-
vernamentais. Atualmente, é notório que a geração de renda a partir do trabalho informal
torna-se ainda mais inviável, contribuindo significativamente para que a população em situ-
ação de rua não possa atender às recomendações de saúde estabelecidas para o combate
à pandemia de Covid-19.
Assim, para esse grupo vulnerável, pode-se dizer que as orientações dos órgãos de saúde
não fazem sentido, pois lavar as mãos, usar álcool em gel, manter a imunidade em alta com
uma boa alimentação e usar máscaras não sãomedidas acessíveis para quem não tem água
para beber e alimentação adequada (não raras vezes comendo o que encontra no lixo), as-
sim como o próprio uso de máscaras torna-se fator de risco, pois, ainda que as obtenham,
não conseguem guardá-las ou higienizá-las de modo correto. Isso sem falar na absoluta
impossibilidade de tais pessoas obedecerem ao distanciamento social, vivendo apinhadas
embaixo de marquises, de viadutos, em caixas de papelão ou em espaços de acolhimento
que reúnemmuitas vezes, em um único local, mais de 100 pessoas.
Além de tudo isso, em algumas regiões do Sul do Brasil, enfrentaremos nos próximos dias
e meses quedas intensas de temperaturas. Durante o último inverno curitibano, antes da
pandemia de Covid-19, diversas vidas foram perdidas para o frio, tendo em vista que tal
condição climática agrava ainda mais os riscos de doenças relacionadas ao sistema respi-
ratório, sobretudo daquelas pessoas que se encontram na situação precária de sobrevi-
vência nas ruas.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ
Fique em casa: o
isolamento social e a
situação de rua
A
partir da recomendação de isolamento social advinda das autoridades sanitárias,
ficar em casa deixou de ser uma opção e tornou-se medida de saúde essencial para
diminuir o número de contaminações e mortes. Temos todos que evitar lugares
públicos e aglomerações, além de lavar as mãos com frequência. Mas e quem não tem casa
onde possa se manter em distanciamento social? E quem não tem água nem produtos de
higiene para lavar as mãos e produtos de limpeza para esterilizar objetos e roupas? Os dias
de pandemia de Covid-19 têm trazido à luz problemas graves que até então estavam invisí-
veis para grande parcela da sociedade.
Pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) indica que, em
2015, existiam 101.854 pessoas em situação de rua no Brasil. Em nota técnica publicada nes-
te mês, o Ipea apresenta uma nova estimativa de que, no mês de março deste ano, aproxi-
madamente 221.869 pessoas estavam nessa condição no país. A cidade de São Paulo, em
quatro anos, apresentou aumento de 53% no número de pessoas em situação de rua, sal-
tando de 15.905 em 2015 para 24.344 em 2019, segundo censo realizado pela administração
municipal. Já na capital paranaense, com base em dados extraídos do Cadastro único para
Programas Sociais do Governo Federal, até março de 2020, havia 2.498 pessoas utilizando
as ruas como espaço de moradia e de sustento, ou buscando as unidades de acolhimento